A cidade do Rio de Janeiro sofreu duas investidas francesas num espaço de um ano. A primeira, entre agosto e setembro de 1710, quando o corsário Jean François Duclerc, à frente de cinco embarcações e 1200 homens, tentou tomar de assalto a cidade, mas foi repelido pelos fortes da entrada da Baía de Guanabara. Desembarcando na região de Guaratiba – mais especificamente entre a praia de Barra de Guaratiba e a restinga da Marambaia – esse exército fez por terra onde hoje é a trilha transcarioca, o caminho até o perímetro urbano, levando uma semana para atingir a cidade. Extenuados pela marcha forçada e surpreendidos pela encarniçada resistência movida pelos defensores, sobretudo a população, livres e escravos, boa parte da tropa francesa foi dizimada em 19 de setembro.

Duclerc e seu exército fez o caminho por terra onde hoje é a trilha transcarioca.

Como praxe nos domínios portugueses, as preocupações defensivas só duraram enquanto o perigo estava na ordem do dia. Nem terminavam as celebrações no Rio de Janeiro e em Lisboa, os franceses preparavam já outra expedição, maior e melhor aparelhada, comandada pelo experiente corsário René Duguay-Trouin. Apesar de vários avisos emitidos a respeito da possibilidade de uma nova investida francesa, o governador Castro Morais não se preparou de forma conveniente para outra invasão. Como se fosse um castigo divino, no dia seguinte o corsário adentrou a Baía de Guanabara e postou suas dezoito embarcações de frente para a urbe. No espaço de uma semana, mais de três mil franceses desceram à terra e foram ocupando os pontos estratégicos da cidade, principalmente os mais altos, sem a resistência das forças locais.

Rota de entrada dos corsários franceses.

No dia 19 o comandante Duguay-Trouin deu um ultimato para o governador para que este capitulasse e entregasse a cidade sob pena dela ser arrasada pela artilharia invasora. O governador se negou mas quarenta e oito horas depois houve uma debandada geral dos sitiados. Homens, mulheres, crianças, idosos, soldados, comerciantes, religiosos e mesmo Francisco de Castro Morais abandonaram o Rio de Janeiro à mercê dos franceses. A cidade estava sob o controle do corsário.

Um ano antes, ao derrotar Duclerc, o governador Francisco de Castro Morais tinha sua bravura e atilamento louvados em impressos elogiosos. Mas a movediça política ultramarina tinha das suas. Agora Castro Morais, administrador experiente do império, convertera-se em um poltrão, um covarde, um precipitado que quis logo negociar com o inimigo mesmo sabendo que havia uma força expedicionária poderosa se encaminhando para a cidade. Por que não resistiu? Havia os terços da infantaria, as milícias, as ordenanças, a escravaria, os índios “frecheiros”. Essas perguntas foram feitas pela população e estimuladas pelos membros do Senado da Câmara.

A argumentação concelhia calou fundo em Lisboa, sobretudo pelo perigo de que houvesse uma rebelião dos moradores do Rio de Janeiro. Governadores ruins poderiam ser substituídos, uma população desgostosa não. Francisco de Castro Morais foi remetido ao reino e condenado ao degredo na Índia, onde permaneceu por duas décadas. Antônio de Albuquerque assumiu o posto interinamente até a chegada de um novo governador, Francisco Xavier de Távora, em 1713.

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